Lamentavelmente, estamos “comemorando” 10 anos que o ÁfricaBrasil Museu Intercontinental, o Museu Imperial de São Mateus e o Memorial Graciano Neves foram fechados e estão sendo destruídos, saqueados, roubados, furtados, abandonados, desvalorizados e negligenciados no Estado do Espírito Santo.
Os referidos museus são privados, adquiridos, montados e mantidos com recursos próprios, mas possuem os mais importantes, representativos, únicos e exclusivos acervos históricos e culturais para uma melhor compreensão da História do Brasil.
Os preciosos recortes museológicos retratam as lutas dos heróis quilombolas que enfrentaram o sistema escravocrata por 300 anos e foram “esquecidos” pela historiografia oficial, além de máscaras e esculturas de várias etnias do Continente Africano, originárias dos séculos XVIII, XIX e XX, que é a maior coleção de arte africana da América Latina e uma das maiores do mundo.
Também estão sendo destruídos, principalmente por falta de recursos financeiros para a necessária manutenção, vários mobiliários de época,
quadros, louças, tapetes, pratarias e peças do Primeiro e Segundo Reinados do Brasil, que fazem parte dos referidos museus localizados no Sítio Histórico Porto de São Mateus, norte do ES.
Há 40 anos, os inigualáveis acervos e os imóveis — tombados pelo Conselho Estadual de Cultura —, foram comprados, restaurados, equipados, administrados com recursos financeiros de seu proprietário e escritor que os manteve em funcionamento, sempre oferecendo entrada gratuita para milhares de visitantes, estudantes, professores, pesquisadores e turistas.
E, de 1965 a 1995, o seu proprietário e escritor foi um dos pioneiros no Brasil a pesquisar as histórias dos heróis quilombolas — para escrever e publicar 40 livros com base na oralidade, que fazem parte da série História dos Quilombolas —, e muitos desses livros de sua autoria são, criminosamente, plagiados e copiados sem a citação da fonte original do autor, sobretudo os livros com as histórias de Zacimba Gaba, Constância de Angola, Benedito Meia-Légua, Negro Rugério, Rosa Flor, Preto Bongo, dentre outros.
Faz-se necessário informar que tanto os imóveis, quanto os acervos e, sobretudo, os livros de autoria do escritor e proprietário dos referidos museus, jamais receberam recursos financeiros da Lei Rouanet ou de outros mecanismos de renúncia fiscal municipal, estadual ou federal, e, durante 40 anos, tudo foi adquirido, realizado e mantido com recursos próprios.
Não obstante isso, em atendimento aos certames do Governo do Estado do Espírito Santo, lançados em 2012, 2013 e 2014, os referidos museus venceram três editais da Secretaria de Estado da Cultura/SECULT — nos valores de 150 mil, 250 mil e 295 mil, totalizando 695 mil reais — para a visita, os estudos e as pesquisas de 100 mil estudantes das escolas públicas, em cumprimento da Lei Federal 10.639 e da Lei Federal 11.645, que alteram a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB, tornando “obrigatório o estudo da História e Cultura Afro-brasileiras e indígena nos estabelecimentos de ensino de primeiro e segundo graus”.
E, como o Governo do Estado do Espírito Santo, após o cumprimento dos objetivos dos editais, deu calote — não pagou os supracitados valores —, o proprietário e escritor ajuizou as legítimas ações de cobrança na Justiça do ES que, apesar de 10 anos, ainda não foram julgadas.
Assim, o prejuízo histórico e cultural para o povo capixaba e a civilização brasileira é irreparável, incalculável e irrecuperável, além de o prejuízo financeiro de seu proprietário e escritor — que, hoje, representa, aproximadamente, 15 milhões de reais —, em decorrência da deterioração dos imóveis, além do furto, saque e roubo de inúmeras peças, da falta de manutenção adequada e das precárias condições de armazenamento dos instrumentos de suplício, como cintos de castidade masculinos e femininos, troncos, algemas, gargalheiras, bolas de ferro para o trabalho no campo, grilhetas e grilhões que comprovam um período de nossa história que muitos museus oficiais não mostram.
Também estão correndo risco de decomposição e ou degeneração as escrituras de compra e venda de escravizados, os processos de castração de homens negros, os documentos com os valores da captura dos “escravos fugidos, desertores e criminosos” — assim denominados pela Polícia, à época — que eram caçados como animais, presos e ou mortos pelos capitães-do-mato, e os demais objetos de enorme valor histórico e cultural para o Estado do Espírito Santo e a Memória Nacional.
Lamentavelmente, 50% desse valioso, único e inigualável acervo museal foi destruído, mas o que restou faz enorme sucesso em exposições no Palácio Tiradentes, na Praça XV, no Rio de Janeiro e na Feira Literária Internacional de Maricá, no Estado do Rio de Janeiro, para um público de 200 mil visitantes, dentre turistas, estudantes, professores e demais interessados no melhor conhecimento da História do Brasil, complementando o que os livros escolares não contam.
E está agendado para o segundo semestre de 2025 uma exposição em Nova Iorque, EUA, com um recorte do que sobrou dos referidos acervos.
Este é retrato da Memória do Estado do Espírito Santo e da História do Brasil que muitos fingem desconhecer e outros desconhecem por fingimento, além da prevaricação dos órgãos estaduais e federais que deveriam defender, preservar e proteger o interesse público e se omitem.
“Parabéns” pelos 10 anos de abandono, desvalorização, destruição, omissão, retaliação e negligência!
Maciel de Aguiar
Escritor e historiador
A matéria não reflete pensamento do Jornal Folha da Vila. É um pensamento do autor.