A importância da atividade física entre os mais novos é indiscutível. Ainda pequenas, muitas crianças já começam a fazer aulas de natação, futebol, ballet, entre outros exercícios que acumulam benefícios a curto e longo prazo.
Mas e quando a atividade é o treino de força? Existe uma idade mínima para que os jovens possam entrar na academia e começar a praticar musculação?
Sim, e pode ser mais cedo do que se imagina. Embora seja comum o receio de muitos pais, devido a mitos como um possível impacto no crescimento, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) estabelece que a partir dos 8 anos já é possível começar um programa de treinamento de resistência. Porém, claro, com as adaptações necessárias.
Nesta faixa etária, por exemplo, o treino deve envolver apenas pesos livres, como halteres e anilhas, de até 15 kg por não mais que 30 minutos e três vezes por semana. Além disso, deve ser feito com supervisão individual e de forma associada a exercícios aeróbicos, como corrida e bicicleta, também por períodos de 30 minutos.
Getúlio Bernardo Morato Filho, pediatra do Grupo de Trabalho sobre Atividade Física da SBP, explica que os 8 anos são uma média, e não necessariamente uma idade fixa. É preciso levar em consideração o contexto da criança para definir se ela está apta ou não a começar um treino de musculação:
“A questão principal não é a idade cronológica, mas sim a capacidade de a criança compreender e seguir orientações. Se ela já tem maturidade para focar em uma tarefa e seguir as instruções de um profissional, ela está apta a começar. O essencial é que a decisão seja guiada pela maturidade e pelo interesse da criança, e não por um número específico de anos”, afirma.
Segundo o especialista, o jovem poderá começar a usar as máquinas fixas quando tiver tamanho suficiente, já que elas são projetadas para adultos, mas ainda de forma supervisionada.
Hugo Tourinho Filho, professor da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo em (EEFERP/USP), explica que novamente é preciso considerar a situação de cada adolescente para fazer essa evolução:
“O maior desafio é adequar as cargas de treinamento de acordo com a idade biológica. Para determiná-la, uma das formas mais práticas é identificar o nível maturacional dos adolescentes que podem ser classificados em pré-púberes (estado infantil), púberes (passando pela puberdade) e pós-púberes (semelhantes aos adultos). Isso é importante porque durante a adolescência é possível encontrar diferentes níveis maturacionais. Aos 15 anos, um adolescente pode apresentar características infantis, enquanto outros já apresentam características de adulto”.
Os especialistas explicam que essa identificação é importante também porque os objetivos do treino vão ser diferentes em cada etapa. No início, os estímulos vão ser mais voltados para atividades que desenvolvem coordenação, força e agilidade de forma natural, enquanto para o adolescente pós-púbere já será possível pensar em maior potência e hipertrofia, que é o aumento da massa muscular.
“Antes dessa fase puberal, o ideal é fortalecer com exercícios livres, elásticos e o próprio peso corporal, garantindo base motora e prevenindo lesões. O risco de lesão às cartilagens é maior nos pré-púberes. As apofisites por tração, que são as lesões mais comuns, se devem a uma combinação do próprio crescimento com o excesso de carga sobre a cartilagem de crescimento. Depois, o ganho de massa muscular deve ser feito de forma gradativa, sob supervisão de profissionais capacitados para que não haja lesão muscular, articular ou óssea”, diz Denise Machado e Silva, presidente do Departamento Científico da Adolescência da Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro (Soperj).
Mas a crença de que fazer treinos de força afeta o crescimento, um dos motivos que levam muitos pais a terem receio em permitir a musculação, é considerada um mito. Uma revisão de estudos com crianças de 7 a 12 anos publicada na Revista Brasileira de Ciência e Movimento concluiu que o treinamento não influencia negativamente o desenvolvimento das crianças.
“Os estudos mostram que a prática de treinos ou de determinados esportes, como basquete e ginástica, não exercem influência sobre o crescimento linear em crianças e adolescentes. Na verdade, se realizado adequadamente, o estímulo mecânico e metabólico contribui para aumentar a densidade óssea e otimizar o desenvolvimento corporal. Assim, o treinamento de força, quando adequadamente orientado, não interfere negativamente nem compromete a altura final”, afirma a endocrinologista pediátrica Marilena de Menezes Cordeiro.
Na The Simple Gym, rede de academias no Rio de Janeiro, por exemplo, o treino pode começar a partir dos 10 anos e, até os 13, é focado em melhorar a movimentação das crianças, e não no levantamento de pesos.
São treinos leves, dinâmicos e voltados para aprendizado técnico, coordenação, postura e consciência corporal, conta Erik Moraes, educador físico especialista em treinamento personalizado e cofundador e gerente de operações da rede:
“São atividades para o jovem dominar o próprio corpo antes de pensar em sobrecarga criando uma base sólida para o futuro. A partir dos 14, já é possível iniciar o treino de musculação de forma mais estruturada, mas sempre com orientação profissional e acompanhamento constante também. O foco deve ser o desenvolvimento da força de maneira progressiva, respeitando o ritmo de crescimento e evitando excessos”.
Benefícios e riscos
Quando seguidas as recomendações, os benefícios da musculação são múltiplos, conta a pediatra Cristiane Murad, contribuindo para o crescimento saudável, desenvolvimento das habilidades e da coordenação motora e melhora da função cardiorrespiratória.
Além disso, proporciona uma melhora da sensibilidade à insulina e efeitos positivos sobre a composição corporal, com aumento do tônus muscular e maior proteção articular. Por outro lado, quando o treino é feito sem acompanhamento e sem ser adequado ao estágio de maturação do jovem, há riscos importantes, alerta a médica:
“Especialmente se houver cargas excessivas ou má técnica, pode provocar lesões musculoesqueléticas, como fraturas, osteocondroses, tendinite, escoliose, entre outras. Há ainda o risco de acidentes nos aparelhos ou com os pesos usados durante a prática de exercícios”.
Getúlio, da SBP, acrescenta ainda os riscos do ambiente social da academia durante a adolescência: “É preciso alertar sobre a influência de colegas e redes sociais no uso indiscriminado de suplementos, o perigo dos anabolizantes e os problemas associados a um volume de treino excessivo e sem acompanhamento”.