Pelo menos 72 mil aposentados no Espírito Santo estão superendividados. Especialistas e aposentados pedem amparo por parte do governo para quem está nessa condição.
O diretor-executivo do Sindicato dos Aposentados no Espírito Santo (Sindnapi-ES), Jânio Araújo, disse que é preciso, por exemplo, que se crie uma câmara, uma vara específica ou mesmo um setor de conciliação próprio para cuidar da situação da pessoa idosa superendividada.
“Na ausência da vara específica, fazer uma câmara de conciliação, onde vão chamar todos os credores desse aposentado. O aposentado preenche uma ficha falando quanto ganha, quanto paga de empréstimo consignado e de empréstimo pessoal, e quanto que sobra para ele. Aí vai propor uma repactuação da dívida que não pode ser maior que 30%”, disse.
O economista Ricardo Paixão destacou que o superendividamento traz problemas para a economia como um todo, não apenas para os cidadãos endividados.
Eles dizem que os passos seguintes para efetivamente implementar a lei do superendividamento devem envolver o governo, o Judiciário, o Banco Central e os bancos. Enquanto um empurra para o outro, o problema segue.
Dados gerais do Banco Central indicam que no Estado esse número de 72 mil aposentados superendividados pode ser até maior. No Brasil, o dado mais recente aponta cerca de 14,7 milhões que estão superendividados, sem recorte por faixa etária, conforme a autarquia.
Bruno da Luz, presidente da Comissão de Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Espírito Santo (OAB-ES), afirmou que hoje não é preciso fazer nenhum tipo de mudança na lei e sim aplicá-la de forma eficiente.
“Advogados, Procons, Ministério Público, magistrados e os consumidores, principalmente idosos e aposentados, têm de tomar conhecimento da lei para poder aplicá-la de forma eficiente. Esse é o principal ponto”, explicou.
O presidente da Comissão de Direito Previdenciário da OAB-ES, Valber Cereza, disse que a lei sugere iniciativas públicas para promover a educação financeira dos consumidores e prevenir o superendividamento, mas que é preciso que se coloque isso em prática.
“A lei proíbe práticas abusivas por parte das instituições, como oferta agressiva de crédito ou pressão ao consumidor, especialmente quando se trata de grupos mais vulneráveis, como idosos”.
Aposentado de 72 anos, José Rodrigues, morador de Jardim Camburi, conta que trabalhava como segurança e se aposentou há 10 anos. Ele fez os primeiros empréstimos logo depois da aposentadoria — alguns ainda estão sendo pagos.
José disse que perde uma parte do valor da aposentadoria, tendo enfrentado algumas dificuldades. Quando fez os primeiros empréstimos consignados, não tinha muito conhecimento ainda.
“No meio dos contratos, eles colocam uma folha para disponibilizar o cartão consignado e, sem conhecimento na época, assinei. É uma mixaria que disponibiliza, mas é um desconto vitalício, então faz falta.” Depois, através do sindicato, conseguiu ser ressarcido pelo banco.
Em outro caso, o morador da Grande Santo Antônio, o aposentado João Carlos dos Santos, 61 anos, trabalhava como estivador e foi aposentado por invalidez após um acidente de trabalho. Sofreu um traumatismo craniano e, depois, teve um princípio de infarto.
Com isso, começou a acumular dívidas, que se tornaram uma bola de neve. “Pega um empréstimo aqui, paga outro ali. Fiz uma portabilidade esta semana”.
Ele disse que hoje não tem plano de saúde e tem dificuldade para pagar água, luz e remédios. “Tudo vem com muita dificuldade”.
SAIBA MAIS
O que é superendividamento?
Segundo o Banco Central, o superendividamento ocorre quando uma pessoa de boa-fé se vê impossibilitada de pagar suas dívidas atuais ou futuras com sua atual renda e seu patrimônio e passa a ter dificuldades de suprir necessidades básicas, como alimentação, moradia e saúde, o que pode causar repercussões psicológicas, familiares e sociais.
Os especialistas afirmam que o superendividamento traz problemas para a economia como um todo, não apenas para os cidadãos endividados.
Legislação
A Lei do Superendividamento (Lei 14.181/21) foi introduzida para proteger brasileiros sobrecarregados com dívidas, numa economia abalada por crises financeiras.
Esta lei visa alterar o Código de Defesa do Consumidor, restringindo instituições financeiras de práticas abusivas, incentivando uma oferta de crédito mais consciente e fornecendo mecanismos de tratamento para superendividados.
Esta lei foi projetada para proteger o consumidor que está superendividado – pessoas com dívidas que excedem a sua renda mensal a ponto de comprometer seu mínimo existencial.
Mínimo existencial
Atualmente, o mínimo existencial é de R$ 600. Este é o valor da renda mensal que os bancos não podem tomar de superendividados.
O percentual de desconto fixado é de 30%, existindo brechas para questões relativas à área de saúde e medicamentos.
Para se livrar do endividamento
Reconhecer que está endividado, aceitar a situação como verdadeira e não ter vergonha ou constrangimento. É importante conversar com seus familiares e as pessoas mais próximas. Eles vão ser parte importante nesse processo de ajuste financeiro.
Replanejamento financeiro: Isso começa por saber o tamanho do problema. É preciso saber quais são todas as dívidas existentes.
Em um caderno ou no computador, relacione todas as suas dúvidas: anote a quem deve, quanto deve, qual o valor, a quantidade de prestações que você ainda tem que pagar, qual a taxa de juros de cada dívida.
Renegociar as dívidas: Tente renegociar as dívidas mais caras (aquelas que têm juros mais altos). Busque melhores condições, prazos mais longos e juros mais baixos. Por exemplo, dívidas com cartão de crédito e cheque especial costumam ter as taxas de juros mais altas do mercado financeiro. Tente substituí-las por dívidas com taxas de juros menores, como empréstimo consignado, ou outra modalidade de crédito com juros menores.
Para resolver o problema, pode procurar os órgãos que oferecem núcleos de apoio ao consumidor ou ao cidadão superendividado.
Os órgãos a seguir, por exemplo, podem ajudar a negociar as dívidas e mesmo descobrir se os juros cobrados estão sendo abusivos ou não: INSS – 135 (informações sobre consignado); Procon – 151; Defensoria Pública; e Tribunal de Justiça (renegociação de dívidas ou orientação jurídica).
Fontes: Banco Central, governo federal e especialistas consultados.